Apoiou as mãos e os pés no chão, como se fizesse uma flexão. Sentiu uma força violenta saindo de dentro de si. Apertou o chão com muita força. Deu um uivo de dor. Sentiu a pele inteira arrebentando. Depois os tendões, músculos e os ossos. Do resto da carne emergiu um bicho, uma criatura indescritível. Olhos negros que tragavam tudo. Sem reflexo. Sem fundo.
Abriu os braços e estufou o peito aspirando todas as trevas
que podia. Elas o inflavam de tal maneira que pulmão ultrapassava o tamanho de
todas as partes do corpo.
Sentia um poder mórbido, que demandava movimento. Tinha uma
ânsia de correr em quatro patas e estraçalhar coisas com suas mãos, como se as
garras que brotavam delas demandassem sangue.
Vontade de arrancar portas, entortar metais. Vontade de
rasgá-la em duas partes e ver o sangue escorrer na calçada, até entrar num
bueiro. Ver os ratos provando daquele líquido vermelho.
Vontade de estraçalhar vidros, cercas, muros, de virar
carros, de derrubar postes. Queria parar carros com seu corpo imenso. Provocar
acidentes em massa, parar as ruas, ouvir as pessoas gritando de pavor.
Queria absorver mais trevas, duplicar de tamanho. Esmagar
crânios.
Antes tinha caído no chão e imaginado uma morte linda.
Permanecia deitado e alguém partia seu peito com uma grande marreta de metal e
concreto. Subia a marreta até o alto para pegar impulso e a abaixava com toda
força. O sangue explodia através da sua boca. Uma morte rápida e poética.
Representava exatamente o que sentia, o coração estraçalhado no chão. Já havia
imaginado mortes, mas nunca uma tão bonita.